Numa sociedade socialista, todos os meios de produção pertencem ao Estado. O Governo decide o que ser produzido, como deve ser produzido e aloca a cada indivíduo uma parte dos bens de consumo. O primeiro modelo – podemos denominá-lo modelo marxista, ou russo – é totalmente burocrático. Todas as atividades econômicas são exercidas por agências do governo, como o são o Exército, a Marinha ou o Departamento dos Correios. A relação de cada fábrica, loja ou fazenda com administração central é a mesma que uma agência de correios tem com o Departamento dos Correios. A nação como um todo é constituída por um exército de trabalhadores obrigados a prestar um serviço compulsório; o comandante desse exército é o Chefe de Estado. O segundo Modelo – podemos denominá-lo modelo alemão – difere do primeiro na medida em que aparente e nominalmente mantém a propriedade privada dos meios de produção, a atividade mantém a propriedade privada dos meios de produção, a atividade empresarial e as trocas efetuadas no mercado. Os empresários compram e vendem, pagam os trabalhadores, contra em dívidas, pagam juros e amortizações. Mas são empresários apenas aparentemente. O governo determina a esses pseudo-empresários como e o que produzir para quem vender, assim como por que preços podem comprar e vender. O governo decreta para quem e em que condições os capitalistas devem emprestar seus recursos, assim como onde e por que salários devem os trabalhadores ser contratados. Nessas condições, o funcionamento do mercado é meramente uma impostura. Como todos os salários, preços e juros estão sendo fixados pelas autoridades, são salários, preços e juros apenas na aparência; na realidade eles expressam simplesmente uma relação quantitativa determinada autoritariamente. São as autoridades, e não o consumidor, que determinam o que ser produzido. Isso é socialismo com uma aparência externa de capitalismo. São mantidos os rótulos de uma economia de mercado capitalista para designar um conteúdo completamente diferente daquele vigente numa verdadeira economia de mercado. Para evitar que se confunda socialismo com intervencionismo é preciso deixar claro que o funcionamento de uma economia de mercado obstruída, ou intervencionismo, difere do socialismo pelo simples fato de continuar a ser uma economia de mercado. As autoridades usam o seu poder de coerção fazendo intervenções que afetam o mercado. Pretendem que a produção e o consumo sigam caminhos diferentes daqueles que seguiriam se não houvesse intervenção, e procuram atingir esse objetivo através de ordens, comandos, proibições para cuja implementação dispõe do aparato de coerção do Estado. Mas, seguem sendo intervenções isoladas; não constituem um sistema integrado que estabelece todos os preços, salários e juros, o que faria com que produção e consumo fossem integralmente determinados pelas autoridades. Este artigo não pretende examinar a questão da viabilidade de uma economia socialista. O tema objeto de nossa análise é o intervencionismo, e não o socialismo. Consequentemente vamos apenas incidentalmente mencionar que o socialismo é impraticável como um sistema econômico universal porque numa sociedade socialista não seria possível utilizar a racionalidade matemática em assuntos de natureza econômica. O cálculo econômico usado na economia capitalista baseia-se em preços de mercado, que são estabelecidos pelo mercado para todos os bens e serviços, inclusive para bens de produção e para a mão-de-obra. Somente preços expressos em moeda corrente podem servir de denominador comum para comparação entre os custos de produção e os valores de venda obtidos no mercado. Só assim pode-se definir em números o provável efeito de uma ação que se pretende programar ou avaliar o efeito real de ações efetuadas no passado. Numa economia socialista onde não existem preços para os bens de produção – uma vez que eles pertencem ao Estado -, não existe a possibilidade de tal comparação. Vamos supor, por exemplo, que o governo de um país socialista deseje construir uma casa. A casa pode ser feita de tijolo, madeira, pedra, concreto ou aço. A casa pode ser feita de tijolo, madeira, pedra, concreto ou aço. Cada um desses métodos de construção tem do ponto de vista do governo que quer construí-la, conveniências e inconveniências; requer diferentes gastos de material e mão-de-obra e tem prazos de execução diferentes. Que método o governo escolherá? Ele não tem um denominador comum que lhe permita comparar os diferentes gastos com materiais e mão-de-obra. Ele não tem como considerar os diferentes prazos de execução e a diferença de vida útil de cada método construtivo. Portanto, ele não tem como comparar gastos e benefícios, custo e retorno. Ele não tem como saber se sua escolha dos meios de produção a serem empregados é a mais racional com base nos valores que ele mesmo atribui aos bens de consumo. No meio do século passado, por exemplo, tal governo poderia se encontrar diante da circunstância de ter que decidir entre restringir a criação de ovelhas na Europa e passar a criá-las em algum ponto da Austrália. Ou substituir a tração animal pela máquina a vapor. Que meios dispõe o governo para determinar qual dessas inovações é vantajosa do ponto de vista econômico? Tudo bem não é infalível; o capitalista também pode errar. E verdade; isso já aconteceu antes e acontecerá de novo, porque toda atividade econômica contém uma expectativa quanto ao futuro, e o futuro é sempre incerto. Todos os planos revelam-se inúteis quando as expectativas em relação ao futuro não se realizam. Esse tipo de objeção não vai ao cerne do problema. Todo cálculo econômico é feito com base no nosso conhecimento atual e com base nas nossas expectativas atuais quanto ao futuro. O problema não consiste no fato de que podemos errar por termos avaliado mal o futuro, mas, mais propriamente, no fato de que o governo de um sistema socialista não tem como efetuar um cálculo econômico com base nas suas próprias avaliações e expectativas. Por exemplo: se um governo quisesse construir hospitais para tratamento de tuberculose, poderia descobrir mais tarde, quando um meio mais simples e mais eficiente de combater essa doença fosse descoberto, que fez um investimento desnecessário. Mas o ponto crucial é o seguinte: como poderia o governo saber, hoje, como construir os hospitais de maneira mais econômica? Algumas estradas de ferro não teriam sido construídas no início deste século, se, àquele tempo, tivesse sido previsto o desenvolvimento que viria a ter a indústria automobilística e a aviação. Mas o empresário que então construía estradas de ferro sabia qual, entre as alternativas de construção, ele deveria escolher, com base nas suas avaliações e expectativas e com base nos preços de mercado que refletiam as avaliações empresariais quanto à demanda futura. É exatamente isso que o governo de uma comunidade socialista não teria como saber. Estaria na mesma situação que o capitão de um navio que tenta navegar sem ter acesso aos recursos da ciência e da arte de navegação. Pressuponha-se que um governo decida levar adiante um determinado projeto. Mesmo para tomar essa decisão ele terá que recorrer ao cálculo econômico. A decisão em favor da construção de uma usina elétrica só pode ser tomada se houver consciência de que esse projeto não estará desviando meios de produção que seriam utilizados para atender necessidades mais urgentes. Como sabê-lo sem ter como recorrer ao cálculo econômico? Artigo original