Nota do Texto: Este texto é um ensaio para uma tese que tem por objetivo demonstrar a composição do lucro, sua importância econômica e social e o impacto que ele gera no desenvolvimento de uma nação, bem como desmistificar o conceito de capital, associado somente ao dinheiro. Críticas ao trabalho são bem-vindas para auxiliar no desenvolvimento da teoria (bem como recomendações de leituras) e podem ser enviadas para o email paulo.planez@gmail.com. Um dos fatores mais importantes em economia é a geração de riqueza. Um dos motivos da importância desse tema é que a geração de riquezas deve acompanhar o crescimento da população, sob pena de estarmos submetendo a população a uma situação de escassez e pobreza e, caso o crescimento da riqueza de uma nação não acompanhe o crescimento da população por um período longo, essa nação será submetida a uma situação de miséria. Tal situação não é de interesse do capitalismo, pois, no caso de uma nação ser submetida à pobreza ou à miséria, a circulação do capital nesta nação se reduz drasticamente, minimizando assim as possibilidades de giro deste capital por conta das reduções das necessidades deste mercado, o que irá reduzir o potencial de crescimento e de geração de riqueza para este capital, impactando, desta forma, o poder de utilidade do mesmo. Nicholas Barbon afirma: 'considerando que uma nação consiste no seu povo, este pode ser mais rico ou mais pobre, mas não o será por consumir o capital da nação, mas sim por não o aumentar, assim como não será por comerciar, mas sim por falta do comércio […] pois uma nação comerciante se torna rica por meio do intercâmbio comercial e da indústria dos seus habitantes […] e que quanto mais livre o comércio, mais próspera a nação'. Antoine de Montchrestién confirma esta tese quando afirma que 'o ato mais importante que se possa praticar no Estado é não permitir que nenhuma de suas partes permaneça ociosa'. Tal afirmação é completada por Barbon quando afirma que 'quando mais empregados houver numa nação, mais rica se torna ela', ideia completada pelo dito de Jaques Turgot ao afirmar que 'um trabalhador que houvesse fabricada uma peça de tecido teria acrescentado uma riqueza real à massa de riquezas do Estado' Pierre de Boisguilbert afirma que 'ao dinheiro cabe a exclusiva tarefa de realizar, no que se refere ao comércio e a agricultura, a união e a distribuição dos bens, não sendo, no entanto, a origem delas', visto que 'o dinheiro não conhece outras leis senão as do consumo', confirmando assim a importância das partes não se manterem ociosas. Benjamin Franklin reconhece essa tese ao afirmar que 'a riqueza de uma nação deve ser avaliada pela quantidade de trabalho que os seus habitantes podem adquirir, e não pela quantidade de ouro e prata que eles possuem' A não ociosidade de das partes, seja do capital ou seja do trabalho, é a responsável pela circulação da riqueza na nação, sendo tal condição de pleno interesse do capitalismo por gerar a possibilidade deste se apresentar como o agente capaz de suprir as necessidades e, assim, gerar mais riqueza, através do lucro das operações comerciais. Adam Smith ainda ilustra a situação acima quando afirma que 'A pobreza de um Estado, ao contrário, consiste na inacessibilidade ou dificuldade com que são obtidos as várias coisas necessárias à existência'. Considerando a ideia de Barbon de que 'uma nação se torna rica na medida em que os seus habitantes se tornam ricos', a não ociosidade de suas partes, fator principal para incrementar a riqueza da nação, dá ao capital a possibilidade de suprir essas várias coisas necessárias à existência, permitindo a este agregar a si mesmo o lucro gerado pelas transações comerciais oriundas destas necessidades, incrementando desta forma seu poder de utilidade, confirmando portanto a tese de que é de interesse do capital a distribuição da riqueza na nação. É conhecido, especialmente pela ciência contábil, que a riqueza não se move por si mesma, senão pela ação de um agente, e é justamente essa movimentação que tem o potencial de transformar o patrimônio pelas suas funções, anulando assim as necessidades do mercado e gerando sua máxima eficácia, o que, consequentemente, gera riqueza, não só para o agente, mas para os atores envolvidos em tal movimentação. Neste contexto, a movimentação de capital se dará pelo poder de utilidade deste capital, que é a relação existente entre o volume de capital e o custo mínimo dos meios produtivos necessários para que o capital possa efetivamente se mover, portanto, é correto dizer que o capital possui um poder de utilidade a partir de um certo volume, que seria o mínimo necessário para se iniciar um processo produtivo destinado a atender determinadas demandas de uma sociedade, sendo que tal volume mínimo não se mantem o mesmo ao longo do tempo, antes, sofre majoração ou minoração pelo efeito das variações que afetam o custo relacionados aos meios necessários para tal produção. A demonstração da rentabilidade das operações é fundamental para se determinar a evolução do capital e, desta forma, determinar o nível de evolução da riqueza inerente a este capital, bem como o benefício possível de ser obtido com ele. Essa rentabilidade é, na maioria das vezes, medida pelo lucro financeiro que determinada operação poderá render ao capitalista. É justamente essa rentabilidade, fruto da movimentação do patrimônio, que agrega a riqueza ao capital, através do lucro que o investidor poderá obter pela movimentação deste. Temos então, pelo menos teoricamente, a criação de riqueza através do processo de movimentação do patrimônio. Porém, até que ponto esse ganho é real? Até que ponto não se trata de um lucro inflacionado? Até que ponto essa operação serviu para garantir ou aumentar o poder de utilidade do capital? A partir de que momento o lucro se torna riqueza? O principal objetivo do acumulo de capital é a obtenção dos benefícios que este capital gera ao distribuir ao seu proprietário os dividendos oriundos da operação deste capital sem que o capital perca seu poder de utilidade, o que poderia dar a entender que os dividendos da operação do capital são, efetivamente, a riqueza gerada por este. Riqueza seria, portanto, a capacidade de incremento do capital de forma a superar os benefícios gerados pelas oportunidades disponíveis e que possuam o potencial de manter, no mínimo, a um risco zero, o poder de utilidade do capital. Esta capacidade é determinada pela Remuneração do capital, que é o que de fato confere ao capital um crescimento concreto de seu poder de utilidade no mercado ao qual está inserido. Uma vez que um determinado capital não tenha superado o custo da oportunidade do mercado, ele na verdade não gerou riqueza, apenas agregou a si (ou até mesmo perdeu) o montante que lhe era determinado pelo mercado para manter o seu poder de utilidade, visto que o custo de oportunidade agrega o mínimo necessário para a movimentação do patrimônio mais o mínimo benefício possível. A definição de lucro apregoado por Adam Smith como 'a quantia que pode ser consumida sem prejudicar o capital' abre margens para a discussão sobre o que significaria a expressão 'prejudicial ao capital'. John Hicks afirmar que o lucro 'é o montante que uma pessoa pode gastar durante um período, e ainda pode estar tão bem ao final do período quanto no início'. A adição da expressão 'estar tão bem ao final do período quanto no início' pode indicar uma preocupação com possíveis variáveis que componham o lucro e que, de alguma forma, estejam relacionadas com a capacidade do capital manter seu poder de utilidade. Hendriksen afirma que o lucro “é imaginado como o fluxo de riqueza ou serviços em excesso àquele necessário para manter o capital constante'. Tal frase demonstra um cuidado em não limitar a definição do lucro e a expressão “capital constante” deixa aberta as possibilidades de debate sobre o que viria a ser a constância do capital, apontando para os mesmos questionamentos sobre as definições de Smith e Hicks. Em todas os casos, algumas das questões que poderiam ser levantadas em relação as afirmações acima seriam: Prejudicar o capital seria retirar um montante tal que não permitisse ao capital remunerar seu proprietário no mesmo montante que a remuneração anterior? Não estar tão bem ao final do período quanto no início poderia significar que se retirou um montante tal que as próximas movimentações do capital não permitiriam gerar o mesmo volume de produção de antes da retirada? Um capital inconstante é aquele em que se retirou um montante tal que a utilidade do capital para a produção de riquezas foi reduzida? A constância do capital estaria ligada com o capital atualizado no tempo? No caso destes autores, a impressão que fica é que o Lucro não foi conceituado de uma forma definitiva, deixando em sua concepção uma preocupação com possíveis variáveis, ainda desconhecidas para a época, que poderiam estar afetando não só o Lucro mas, também, o capital. O poder de utilidade do capital, que é a capacidade do capital em manter, no mínimo, a mesma capacidade de financiamento do processo produtivo já percebido no passado é, de fato, uma das principais preocupações do capitalista, pois, somente desta forma ele conseguirá não só manter, mas também ampliar sua riqueza, visto que, se tal capacidade for reduzida, o potencial produtivo também o será, reduzindo, por consequência, os lucros futuros e os benefícios possíveis de serem distribuídos. Tal preocupação é justificada pela afirmação de Alfred Marshall: 'O capital é aquela parte da riqueza dedicada a obter mais riqueza'. Visto que a riqueza se dá pela movimentação do capital e o capital se movimenta de acordo com seu poder de utilidade, qualquer redução do poder de utilidade reduz também a capacidade de geração de riqueza. Hendriksen e Breda (1999) afirmam que 'o lucro se baseia no conceito da preservação do capital, ou seja, o lucro é definido pelo montante que uma empresa poderia distribuir a seus acionistas e ficar ao final do exercício em situação idêntica àquela que se encontrava no início', aparentemente considerando somente o efeito da rentabilidade na eficácia do lucro, desprezando assim o poder de utilidade. Um capitalista que desprezar as variações do poder de utilidade de seu capital, beneficiando-se da integridade do lucro da operação, poderá estar pior ao final do período, visto que o capital tenderá a perder o poder de utilidade, o que gerará dificuldade para que tal capital reiniciar seus movimentos em busca das transformações necessárias ao atendimento das demandas da sociedade, fator fundamental para se obter o lucro. Portanto, o lucro real, aquele ao qual o capitalista pode dispor, é uma função do poder de utilidade do capital ao longo do tempo e não apenas uma função de sua rentabilidade na operação e tem por objetivo minimizar a possibilidade de que reinvestimentos sejam necessários para manter sua capacidade de atendimento das demandas sociais. Quanto menos dinâmico, sofisticado e equilibrado for o mercado no qual o capital está inserido – o que gera maior concorrência pelo capital disponível, aumentado a remuneração paga por sua disponibilização – maior será o seu custo de oportunidade, gerando assim necessidades maiores de lucro nas operações, de forma a cobrir as variáveis que compõe este lucro e permitir uma remuneração real do capital, de forma que este chegue ao patamar de criação de riqueza, patamar este que é, no mínimo, a garantia de manter o capital com o mesmo poder de utilidade de antes da operação depois de tirar deste sua parcela de benefício. O custo de oportunidade é, portanto, uma função móvel da economia, pois irá variar conforme a facilidade ou restrição aos movimentos do capital, a disponibilidade de instrumentos financeiros que permitam diversificação e geração mínima de riqueza, dentro de um ambiente de relativa estabilidade econômica. Como exemplo pode-se citar o capitalista que, possuidor de um capital financeiro de $100 unidades monetárias, investiu em um título conservador garantido por um governo confiável que foi remunerado a 4% em um dado período em que a inflação foi também de 4%. O ganho atendeu aos custos de oportunidade do mercado, mas não agregou riqueza ao capital, pois seu poder de utilidade não aumentou, podendo inclusive nem mesmo ter se mantido, pois, findado o período, o custo de oportunidade estará aumentado, visto que o poder de utilidade do capital foi diretamente afetado pelos fatores inflacionários, sendo tais diferenças prejuízo para o capitalista, pois este não se atentou às variações dos demais componentes do lucro, criando para o capitalista a necessidade de incremento do capital, através do reinvestimento ou da incorporação de novo capital, para que seu capital mantenha o poder de utilidade de outrora. A base para a criação da riqueza está no lucro gerado por uma determinada operação a partir de um determinado capital. O lucro, que se transforma em riqueza, considera os seguintes fatores: Lucro = (Custo de Oportunidade + Correção Monetária do período + Percentual de reinvestimento do capital) + (O Risco da operação + Remuneração do capital) O próprio Adam Smith reconhecia que o lucro continha outros elementos que não o juro sobre o capital assim como J.S. Mills reconhecia a influência do risco no processo. Esta composição detalha o lucro em duas partes: A parte passiva do lucro são aquelas às quais o capitalista tem pouco poder de ação, sendo este também o ganho mínimo para que se mantenha o poder de utilidade do capital, a saber: O custo de Oportunidade: Que depende do ambiente e do segmento econômico ao qual o capital está inserido, sendo esta variável de acordo com as condições deste ambiente. A correção monetária do período: Corresponde à parcela do lucro que é utilizado para manter o poder de utilidade do capital em um determinado período, utilizado principalmente na correção dos preços dos meios de produção, que pode ser medido através da variação dos preços aplicado a estes meios. O Percentual de reinvestimento do capital: Indica o percentual que o capitalista precisa aportar em seu capital, além dos demais ganhos, para que este mantenha seu poder de utilidade. Também existe a parte ativa da composição, parte esta na qual o capitalista tem total poder de ação, que são: O risco da operação: Representa a parcela de risco que é computada ao investimento de forma a minimizar possíveis perdas no capital. Remuneração do Capital: É a parcela de ganho da operação que possui a capacidade de aumentar, de forma concreta e objetiva, o poder de utilidade do capital e do qual o capitalista pode tirar algum benefício sem impactar o poder de utilidade deste mesmo capital. Em O Capital (Volume III) Karl Marx cita as diversas formas de renda: 'Há formas bastante diversas de rendas, que podem todavia ser classificadas em três grupos: O Capital rende cada ano ao capitalista um Lucro, a terra rende ao proprietário rural uma renda fundiária e a força de trabalho – em condições normais e enquanto permaneça útil – rende ao operário o salário' Tais fundamentos podem ser aplicados ao capital em toda a sua essência, considerando as divisões do capital como o Financeiro, o Fundiário, o Trabalho, sendo: O Capital Financeiro é o montante monetário acumulado por um indivíduo. O Capital Fundiário é qualquer propriedade em posse de um indivíduo passível de produção ou renda. O Capital Trabalho é a posse por determinado indivíduo de habilidades que sejam de interesse do mercado. Porém, Marx desconsidera o Produto como um capital. Ainda no volume III ele afirma: 'A circulação ou troca de mercadorias não cria valor' pois, segundo ele, 'Vender mercadorias acima de seu valor a classe operária significa apenas extorquir uma parte do dinheiro que lhe foi dado por nada', já que 'é durante a produção que se deve formar um novo valor'. Já Condillac afirma: 'É falso que se dê, no comércio de mercadorias o mesmo valor para o mesmo valor. Ao contrário, um dos dois negociantes dá sempre um valor menor para um valor maior. Se esse negociasse sempre com valores iguais não haveria lucro para nenhum dos negociantes'. Portanto, avalia-se que Marx possa ter desprezado uma importante forma de renda, provavelmente por conta de suas fortes convicções, o que o limitou sua classificação de forma adequada. Desta forma considerar-se-á também, baseado na colocação de Condillac, um outro elemento como capital: O capital Produto. O Capital Produto é a posse por um indivíduo de determinado elemento passível de negociação e circulação no mercado. Cada qual dos elementos de capital possuem suas características de custo de oportunidade, a saber: Para o Capital Financeiro é a remuneração possível para este capital considerando o risco zero. Para o Capital Fundiário é a renda possível de ser gerada por esta propriedade considerando o risco zero. Para o Capital Trabalho é a remuneração mínima paga em determinado mercado por uma determinada habilidade e que garanta a atualização de tal habilidade. Para o Capital Produto é a remuneração mínima paga por determinado produto em determinado mercado de forma a permitir tanto reposição do produto quanto um benefício financeiro pelo processo de movimentação, considerando que o risco de não recebimento dos valores financeiros contratados para tal negociação seja zero. Dentro da composição do lucro, cada capital possui também características de reinvestimento que permitirá ao capital manter seu poder de utilidade, a saber: Para o Capital Financeiro é o valor que deve ser agregado para cobrir possíveis aumentos do patamar de utilidade do capital, aumentos estes que podem ser causados pela entrada de novos capitais ou pelo incremento significativo de capital através da eficácia de suas mutações. Para o Capital Fundiário é o valor necessário para transformação da propriedade de forma a mantê-la útil para a produção ou geração de renda. Para o Capital Produto é o valor necessário para manter o interesse do mercado no produto. Para o Capital Trabalho é o valor necessário para manter a utilidade da habilidade, de forma a manter o interesse do mercado por esta. As demais variáveis são comuns para todos os capitais, que são: A correção monetária: Se refere ao incremento necessário no período para que se mantenha o poder de utilidade do capital, considerado o impacto inflacionário sobre este. O risco da operação: Se refere a uma parcela de remuneração que permita ao capitalista minimizar o risco de perdas geradas pela operação. A principal característica desta variável é que, em não acontecendo o risco, ela exerce integralmente o potencial de incremento do capital, funcionando como remuneração do capital e contribuindo para o aumento do poder de utilidade. Desta forma, a riqueza incrementada pelo lucro se refere somente à porção do ganho que deu ao capitalista um incremento concreto do poder de utilidade de seu capital. Atualizações no texto: 22/07/2015 (0700) 24/02/2016 (1115) 10/08/2016 (1975) 13/09/2017 (3506)