Apesar das diferenças culturais, essas tradições compartilham um princípio central As festas de fim de ano costumam ser vendidas como um período de união, afeto e celebração. Na prática, porém, para muitas pessoas elas se transformam em uma maratona de compras, gastos excessivos e ansiedade. Presentes acumulam-se, listas se alongam e o foco escorrega facilmente do encontro para o consumo. Esse desvio não pesa apenas no bolso. Pesquisas em psicologia mostram que quanto maior o foco em bens materiais, maior a probabilidade de sentimentos como ansiedade, insatisfação e até depressão. O paradoxo é evidente: quanto mais tentamos comprar felicidade, menos ela aparece. Em vez de fortalecer vínculos, o excesso de consumo tende a esvaziar o sentido do período. Segundo reportagem da BBC, uma forma eficaz de escapar dessa armadilha é observar como outras culturas celebram o fim de ano com menos apego a objetos e mais atenção à convivência. Em diferentes partes do mundo, rituais simples ajudam a deslocar o centro da celebração do 'ter' para o 'estar junto'. Livros como ponto de encontro Na Islândia, um costume criado durante a Segunda Guerra Mundial se transformou em tradição nacional. Com bens escassos, mas papel abundante, famílias passaram a trocar livros na véspera de Natal e a dedicar a noite à leitura conjunta. O hábito ficou conhecido como jólabókaflóð, algo como 'a inundação de livros de Natal'. A prática resiste até hoje e oferece uma alternativa elegante ao consumismo. Um livro escolhido com atenção carrega significado, revela cuidado e convida à pausa. Em um mundo de estímulos rápidos e telas constantes, reservar tempo para ler juntos também resgata a atenção, o diálogo e o prazer da narrativa compartilhada. Criar em vez de comprar Em países do Leste Europeu, como a Ucrânia, o Natal também é marcado por enfeites artesanais. Em vez de ornamentos industrializados, famílias produzem decorações à mão, muitas vezes feitas de papel e fios, inspiradas em lendas populares. Em outras regiões, como a Dinamarca, sessões coletivas de artesanato fazem parte da preparação das casas, escolas e escritórios para as festas. Esses encontros combinam dois fatores fortemente associados ao bem-estar: interação social e atividade criativa. Produzir algo juntos reduz a pressão por perfeição estética e desloca o valor do objeto final para a experiência compartilhada durante o processo. Brincar como ritual No hemisfério sul, onde o Natal acontece no verão, algumas tradições seguem caminhos ainda mais distantes do consumo. Na Austrália, por exemplo, é comum famílias se reunirem para jogos ao ar livre no dia de Natal. O destaque não está na troca de presentes, mas no tempo dedicado a brincar, rir e competir de forma leve. A ciência reforça esse caminho. Atividades lúdicas reduzem o estresse, estimulam a criatividade e fortalecem vínculos emocionais. Jogos de tabuleiro, esportes improvisados ou qualquer brincadeira coletiva cumprem o mesmo papel: criar memórias que não cabem em uma embalagem. O que realmente fica Apesar das diferenças culturais, essas tradições compartilham um princípio central. Todas retiram o foco do que é comprado e colocam no que é vivido. O valor está no tempo, na atenção e na presença, não no volume de pacotes sob a árvore. Adotar um ritual menos materialista não exige copiar costumes estrangeiros ao pé da letra. Basta escolher práticas que reforcem o que muitas vezes se perde no meio da correria: o encontro genuíno. Em um período marcado por expectativas elevadas, lembrar que pessoas importam mais do que coisas pode ser o gesto mais transformador do fim de ano.