Autores reforçam que o estudo não significa que comer queijo previne demência, nem que o alimento deva ser visto como uma solução isolada Um novo estudo científico encontrou uma associação entre o consumo de queijos ricos em gordura e a redução do risco de demência ao longo da vida. A pesquisa indica que pessoas que consomem pelo menos 50 gramas diárias de queijos como brie, gouda, cheddar, parmesão, gruyere e muçarela apresentaram menor incidência da doença quando comparadas àquelas com ingestão muito baixa do alimento. O tema chama atenção diante da dimensão do problema. Em 2021, cerca de 57 milhões de pessoas viviam com demência no mundo, com aproximadamente 10 milhões de novos diagnósticos por ano. Projeções do Global Burden of Disease indicam que esse número pode chegar a 153 milhões até 2050. Diante da escassez de tratamentos curativos, grande parte da pesquisa científica tem se concentrado em fatores de risco modificáveis, como alimentação e estilo de vida. O estudo foi conduzido por pesquisadores da Universidade de Lund, na Suécia, liderados pelo epidemiologista nutricional Yufeng Du. A equipe analisou dados do Malmö Diet and Cancer Study, uma coorte que acompanhou quase 28 mil adultos suecos ao longo de 25 anos. No início do acompanhamento, os participantes passaram por entrevistas detalhadas sobre hábitos alimentares e preencheram diários alimentares de sete dias. As informações foram então cruzadas com os diagnósticos de demência registrados ao final do período. Os resultados mostraram que aproximadamente 10% dos indivíduos que consumiam ao menos 50 gramas de queijo gorduroso por dia desenvolveram demência, contra cerca de 13% entre aqueles que ingeriam menos de 15 gramas diárias. A diferença foi estatisticamente significativa, embora os mecanismos por trás dessa associação ainda não estejam claros. Segundo Emily Sonestedt, epidemiologista da Universidade de Lund e coautora do estudo, os achados desafiam algumas visões tradicionais sobre gordura na dieta. Por décadas, o debate entre alimentos com alto ou baixo teor de gordura influenciou recomendações nutricionais, muitas vezes colocando o queijo na lista de itens a serem evitados. 'Nosso estudo sugere que alguns laticínios ricos em gordura podem, na verdade, estar associados a um menor risco de demência, o que questiona suposições antigas sobre gordura e saúde cerebral', afirma. Apesar do resultado promissor, os próprios pesquisadores e especialistas externos alertam para limitações importantes. A principal delas é que o consumo alimentar foi medido apenas uma vez, no início do estudo, cerca de 25 anos antes da avaliação dos diagnósticos de demência. Mudanças significativas na dieta e no estilo de vida ao longo desse período não foram captadas. Tara Spires-Jones, líder de divisão no UK Dementia Research Institute, que não participou da pesquisa, destaca esse ponto. Segundo ela, é altamente provável que hábitos alimentares e outros fatores tenham se alterado ao longo das décadas, o que dificulta estabelecer uma relação direta de causa e efeito. Os autores reforçam que o estudo não significa que comer queijo previne demência, nem que o alimento deva ser visto como uma solução isolada. Os resultados indicam apenas uma associação, que precisa ser confirmada por novas pesquisas, incluindo estudos clínicos e análises que considerem padrões alimentares ao longo do tempo. Ainda assim, o trabalho contribui para um debate mais amplo sobre nutrição, envelhecimento e saúde do cérebro, sugerindo que a relação entre gorduras, laticínios e cognição pode ser mais complexa do que se imaginava até agora.