Estudo indica que adoção de IA concentra aumentos salariais no topo e reduz demanda por cargos de menor renda A discussão sobre o impacto da inteligência artificial no mercado de trabalho ainda está longe de um veredito definitivo. Mas novas evidências sugerem que, no curto prazo, a tecnologia já está produzindo um efeito mensurável e preocupante: a compressão dos salários mais baixos e a concentração de oportunidades nas faixas de renda mais altas. Dados da empresa de analytics Revelio, de Nova York, apontam que desde janeiro de 2023, período que coincide com a popularização do ChatGPT, os salários do quartil superior do mercado cresceram mais de 30%, enquanto os salários das faixas inferiores subiram cerca de 10%. Para os pesquisadores, o contraste é um sinal de que a automação está suprimindo os ganhos de trabalhadores de menor renda, desafiando a narrativa de que a IA afetaria principalmente empregos qualificados e bem remunerados. O que os números revelam sobre a mudança em curso O estudo mostra também um deslocamento na demanda por vagas. Segundo a Revelio, o apetite das empresas por cargos de maior remuneração permaneceu forte, ao passo que a procura por funções menos bem pagas caiu nos últimos dois anos. Não se trata de uma retração uniforme do mercado, e o próprio relatório reconhece que alguns postos na base ainda registram crescimento salarial, especialmente em áreas como vendas, serviços jurídicos e funções de proteção. Esses papéis têm algo em comum: exigem interação humana intensa e, por ora, apresentam menor propensão à automação. A análise vai além dos percentuais e propõe uma correlação clara. Em média, quanto maior a adoção de IA numa ocupação, menor a evolução salarial na parte de baixo da distribuição. Ou seja, as funções com crescimento mais fraco tendem a ser exatamente aquelas em que os empregadores investem mais em automação. No topo, essa relação aparece de forma muito mais tênue, porque os aumentos seguem impulsionados pela demanda por talentos especializados e técnicos, capacidades que a IA ainda não consegue substituir de modo consistente. Por que isso importa para empresas e para a gestão de pessoas O cenário descrito pelo relatório desenha um mercado em que oportunidades e valorização se concentram cada vez mais nos profissionais seniores ou altamente especializados. Em termos práticos, isso significa que trabalhadores com menos qualificação, geralmente em posições operacionais ou rotineiras, ficam mais expostos à estagnação salarial e à redução do número de vagas disponíveis. Esse movimento ganha ainda mais peso quando cruzado com outro dado citado pela reportagem: pesquisas da Society for Human Resource Management indicam que cerca de 13% dos empregos nos Estados Unidos enfrentam risco alto ou muito alto de deslocamento por automação no curto prazo. São funções marcadas por tarefas repetitivas, justamente o alvo preferencial da adoção de IA e robótica avançada. Para líderes empresariais, os números acendem um alerta sobre como implementar IA sem corroer a confiança interna. Se empregados percebem que a tecnologia está associada à perda de renda, de perspectivas de carreira ou de oportunidades, a reação tende a ser resistência, não engajamento. O texto sugere que empresas devem ser transparentes sobre seus planos, explicitar limites de uso da IA e reforçar compromissos de desenvolvimento profissional para quem está nos níveis mais vulneráveis da cadeia de trabalho. Na prática, também pode haver impactos no recrutamento. Se a demanda por funções de menor renda cai, é provável que cresça a oferta de profissionais nessa faixa, elevando a pressão competitiva por poucas vagas. Para organizações, isso reforça a necessidade de programas de requalificação e trilhas claras de evolução, caso queiram manter uma base motivada e evitar que a promessa de eficiência se transforme em desmobilização. Em resumo, a IA pode estar acelerando ganhos para alguns, mas também está redefinindo quem se beneficia do crescimento. E, para empresas que desejam colher produtividade sem ampliar fraturas internas, a mensagem dos dados é direta: tecnologia não substitui estratégia de pessoas.