Talentos não saem apenas por propostas melhores. Saem quando deixam de enxergar futuro onde estão Você pode ter um bom salário, uma marca forte e um escritório bonito. Mesmo assim, talentos saem. E, muitas vezes, saem sem drama: sem briga, sem aviso prévio emocional, sem 'sinais claros' que a liderança reconheça a tempo. A demissão chega como surpresa, mas para quem pediu, a decisão já estava amadurecendo há meses. O que muda não é um evento único. É uma sequência de pequenas frustrações que vão drenando o senso de futuro. A intenção de sair costuma crescer quando há sensação de injustiça, falta de desenvolvimento e baixa confiança na liderança direta. Profissionais não abandonam apenas tarefas. Abandonam a experiência de trabalhar em um ambiente onde esforço não vira crescimento, onde conversas não viram ação e onde o dia a dia parece cada vez mais pesado. A saída começa quando a energia vira autoproteção O primeiro sinal raramente é queda brusca de performance. É uma mudança de postura. A pessoa para de propor, evita exposição e passa a se proteger. Ela entrega o necessário, mas com menos vontade de puxar o time. É como se o trabalho deixasse de ser construção e virasse defesa. Você já viu alguém que antes era proativo começar a ficar 'na dele' sem motivo aparente? Essa transição costuma ser interpretada como desmotivação pessoal. Só que, em geral, é um ajuste emocional a um contexto percebido como instável ou injusto. Quando o profissional não confia que vale a pena investir energia extra, ele economiza. A economia começa no entusiasmo, depois chega na iniciativa. O que a liderança faz sem perceber Muitos talentos saem porque convivem com incoerência. Promessas de autonomia seguidas de microgestão. Discursos sobre bem-estar seguidos de urgência permanente. Conversas sobre meritocracia seguidas de critérios nebulosos. A incoerência não precisa ser escandalosa para corroer confiança. Basta ser repetida. Outro ponto é a ausência de desenvolvimento real. Profissionais ambiciosos não querem só elogio. Querem desafio, repertório e perspectiva. Quando o trabalho vira repetição, a pessoa sente que está ficando para trás. E quando ela tenta conversar e não vê mudança concreta, começa a procurar fora aquilo que não encontra dentro. O silêncio que antecede a carta de demissão Existe um momento-chave: quando o profissional para de reclamar. Parece bom, mas é perigoso. Reclamação, quando bem endereçada, é sinal de esperança. Significa que a pessoa ainda acredita que a empresa pode melhorar. Quando ela fica quieta, muitas vezes é porque já desistiu de ser ouvida. Nessa fase, o time pode até achar que 'o clima melhorou'. Só que o que melhorou foi a disposição de confrontar. A pessoa já está avaliando opções, reescrevendo seu futuro e reduzindo laços emocionais com o trabalho. A saída, nesse cenário, não é impulso. É consequência. Como empresas seguram talentos sem prometer o impossível O primeiro passo é clareza. Talentos toleram desafios quando entendem o porquê e veem critério nas decisões. Contexto bem comunicado reduz ansiedade e evita interpretações pessimistas. O segundo passo é justiça percebida: regras consistentes, reconhecimento específico e distribuição de carga que não puna sempre os mais responsáveis. O terceiro passo é conversa com ação. Não basta abrir espaço para feedback se nada muda depois. Pergunte o que está drenando energia, o que está travando crescimento e o que a pessoa precisa para continuar. E, mais importante, mostre um ajuste concreto, mesmo que pequeno. Microações consistentes restauram confiança mais rápido do que grandes discursos. No fim, talentos não saem apenas por propostas melhores. Saem quando deixam de enxergar futuro onde estão. A pergunta que líderes deveriam se fazer com frequência é simples: as pessoas aqui sentem que estão evoluindo ou apenas aguentando? A resposta costuma aparecer antes da demissão, mas só para quem está disposto a escutar o que o silêncio está dizendo.