O mundo que vem exigirá líderes capazes de aprender sem parar, decidir com sensibilidade e liderar com propósito O mundo dos negócios atravessa uma era de ruptura contínua. Pandemias, guerras comerciais, inteligência artificial e novas pressões sociais e ambientais remodelam, a cada trimestre, os parâmetros de sucesso nas organizações. Em 2024, quase 2 mil CEOs deixaram seus cargos nos Estados Unidos — número recorde, que sinaliza mais do que um esgotamento executivo: revela uma mudança estrutural no perfil necessário para liderar. As empresas enfrentam um paradoxo: ao mesmo tempo em que perdem líderes experientes, encontram dificuldade em identificar sucessores prontos para navegar essa complexidade. Afinal, o que será exigido dos futuros CEOs — e como prepará-los? Três vozes de referência no assunto oferecem respostas: Ginni Rometty (ex-CEO da IBM), Nitin Nohria (ex-reitor da Harvard Business School) e Gary Burnison (CEO da Korn Ferry). Comportamentos valem mais do que diplomas Para Ginni Rometty, liderar no século XXI exige uma combinação de curiosidade, responsabilidade e relações autênticas. Não precisamos saber tudo, mas fazer as perguntas certas, resume. Ela defende a mentalidade de “atleta olímpico” no aprendizado contínuo — prática que instituiu na IBM ao criar uma cultura de desenvolvimento constante, inclusive assumindo pessoalmente a liderança de treinamentos. Mas além da aprendizagem, Rometty destaca dois pontos críticos: o uso ético da tecnologia e a construção de resiliência emocional por meio de relacionamentos verdadeiros. As melhores decisões não vêm de métricas de curto prazo, mas de valores de longo prazo, afirma. Julgar com proporção: a habilidade invisível dos grandes líderes Nitin Nohria aponta uma competência muitas vezes negligenciada: a capacidade de calibrar a importância de cada problema. A primeira tarefa de um líder é o triagem: distinguir o sinal do ruído, ensina. Nohria compara a tomada de decisão à lógica bayesiana: começar com uma hipótese informada e atualizá-la à medida que novas evidências surgem. Essa habilidade é vital em tempos de mudanças velozes, como as que a IA está impondo a setores inteiros. Ele também defende que empresas promovam uma cultura de debate rigoroso e escuta ativa. “Segurança psicológica não é um luxo — é essencial”, diz. A habilidade de ouvir visões contrárias afia o senso crítico e aprimora decisões. Agilidade, resiliência e pensamento integrativo: o novo tripé da liderança Para Gary Burnison, três traços antes vistos como diferenciais se tornaram obrigatórios: agilidade, resiliência e pensamento integrativo. Agilidade não é improvisação: é a capacidade de ajustar o curso diante do inesperado, mesmo sem ter todas as respostas. Resiliência vai além da força individual; envolve visibilidade, comunicação e a capacidade de inspirar movimento coletivo após falhas. Já o pensamento integrativo é a habilidade de considerar perspectivas múltiplas e contraditórias — e sintetizá-las em soluções inovadoras. É como jogar xadrez em 3D, compara Burnison. Autoconhecimento: o ponto de partida de toda liderança Mais do que qualquer habilidade técnica, os três especialistas convergem em um ponto: autoconhecimento é a base da liderança eficaz. Segundo dados da Korn Ferry, 79% dos líderes não enxergam com clareza seus pontos fortes e fracos. Aqueles que superestimam suas competências têm até seis vezes mais chances de fracassar. O desenvolvimento da próxima geração de CEOs passa, necessariamente, por feedbacks constantes, reflexões estruturadas e cultura de autoconsciência. O CEO do futuro já está em formação — dentro ou fora do cargo O mundo que vem exigirá líderes capazes de aprender sem parar, decidir com sensibilidade e liderar com propósito. O sucesso não virá apenas de diplomas ou experiências passadas, mas de comportamentos treináveis: empatia, julgamento, curiosidade e coragem. A preparação dos novos CEOs começa hoje — e está menos nos manuais de gestão e mais na prática consciente de como aprender, conectar, decidir e servir.