Negócios sustentáveis não são construídos por quem suporta sistemas ruins, mas por quem tem coragem e habilidade para torná-los melhores Em muitas empresas, quem mais aguenta vira referência. Aguenta pressão, aguenta mudança de escopo, aguenta cobrança fora de hora, aguenta falta de recurso, aguenta conflito mal resolvido. Essa pessoa entrega, não reclama e ainda resolve o que sobra. Resultado: é promovida. O problema é que, ao fazer isso, a empresa pode estar premiando resistência ao caos, não competência de liderança. E isso cria um risco invisível para o futuro do negócio. Organizações que confundem resiliência com capacidade de liderança tendem a escalar pessoas exaustas, que mantêm sistemas disfuncionais funcionando, em vez de líderes que melhoram o sistema. 'Aguentar tudo' é sinal de adaptação individual, não necessariamente de maturidade organizacional. Quando aguentar vira critério, o problema vira padrão Profissionais que 'aguentam tudo' costumam ser ótimos solucionadores. Eles compensam falhas de processo, traduzem decisões confusas, absorvem tensão e evitam crises maiores. No curto prazo, isso é valioso. No médio prazo, vira anestesia organizacional. A empresa deixa de sentir dor. E, sem dor, não há mudança. Processos ruins continuam, prioridades confusas persistem e comportamentos tóxicos passam sem correção, porque sempre há alguém para amortecer o impacto. Quando esse alguém é promovido, o padrão se consolida. O custo emocional de liderar a partir do desgaste Quando você promove quem está sempre no limite, você leva o limite para cima. A pessoa sobe de cargo já cansada, com menos reserva emocional e com um aprendizado perigoso: liderar é aguentar mais. Em vez de questionar o sistema, ela tende a reproduzi-lo, cobrando da equipe a mesma capacidade de suportar pressão que ela desenvolveu. Isso cria uma cultura de resistência, não de saúde. O time aprende que valor vem de suportar, não de melhorar. E suportar tem teto. Uma hora, o corpo, a mente ou a motivação quebram. O que fica invisível na avaliação de desempenho Avaliações tradicionais costumam medir entrega, disponibilidade e comprometimento. Raramente medem algo crucial: a pessoa melhora o sistema ou apenas se sacrifica por ele? Quem 'aguenta tudo' pode estar resolvendo sintomas, não causas. Pode estar sendo herói operacional, mas não arquiteto de soluções. E liderança de verdade exige arquitetura: criar clareza, reduzir ruído, proteger energia do time, fechar ciclos e estabelecer limites. O que observar antes de promover Uma pergunta simples ajuda: essa pessoa reduz a necessidade de heroísmo ou depende dele? Líderes fortes constroem estruturas que funcionam sem esforço extra constante. Eles dizem não quando necessário, organizam prioridades, corrigem padrões e protegem o time de urgência desnecessária. Outro ponto é observar como a pessoa lida com limites. Ela consegue negociar escopo? Consegue escalar problemas cedo? Consegue dizer 'assim não funciona' sem virar conflito? Ou apenas absorve tudo e segue? Como mudar o critério sem perder quem entrega Valorizar quem entrega não é o problema. O problema é só valorizar isso. Empresas maduras ampliam o critério: além de entregar, o profissional precisa reduzir caos, desenvolver outros, melhorar processos e tomar decisões que evitem repetição de desgaste. Também é papel da liderança intervir antes da promoção. Se alguém 'aguenta tudo', talvez precise de suporte, não de mais carga. Às vezes, o melhor desenvolvimento não é subir de cargo, é tirar peso. No fim, promover quem aguenta tudo parece reconhecimento, mas pode ser um atalho perigoso. Negócios sustentáveis não são construídos por quem suporta sistemas ruins, mas por quem tem coragem e habilidade para torná-los melhores. Liderança não é sobre aguentar mais. É sobre fazer o trabalho doer menos para todo mundo.